A pixação é a voz que se faz ouvir através dos muros da cidade. A janela quebrada da Prefeitura ou o ônibus queimado é a indignação de uma parcela do povo encurralado diariamente pela violência estatal e privada que irrompe pelas ruas. Ambas as ações são políticas e gritam: vocês têm que nos escutar, nós não vamos mais nos calar diante da repressão.
Nem toda ação é política, mas não achem que janelas são quebradas por diversão. É preciso não generalizar pequenos atos condenáveis, pois o grande contexto mostra que a “quebradeira” e a pixação nada têm de baderna ou violência, elas são a voz cheia de raiva e indignação contra a exploração e desigualdade do país.
Vandalismo não é pixar um muro reclamando por mais direitos; é negar esses direitos ao povo (aliás, por que apenas a mensagem deixada nos muros é suja e incomoda enquanto a cidade é coberta com placas e luminosos com publicidades e propaganda?). Vandalismo não é quebrar a janela de uma Prefeitura que se recusa a conversar, escutar, avaliar e propor alternativas às reivindicações das pessoas; é mandar a Brigada Militar ir às ruas sem estar identificada para agredir e perseguir manifestantes com a única intenção de violentá-los.
Portanto, vandalismo é o que o Estado e setor privado fazem com a população com uma educação deficiente onde há adolescentes saindo da escola semi-analfabetos, um sistema de saúde debilitado onde pessoas morrem amontoadas em corredores de hospitais, um transporte público-privado de péssima qualidade e com preços exorbitantes justificado em um modelo de mobilidade urbana que prioriza os carros e não as pessoas, uma polícia mal treinada e mal equipada eficiente apenas em aterrorizar as populações pobres.
E não pensem que o diálogo não foi buscado: a rua só começou a ser ocupada depois de meses de tentativas de diálogo com a Prefeitura que sempre se recusou a conversar e apenas afirmava que manteria tudo como estava. O caminho pacífico é sim o ideal, mas nem sempre ele é possível, e aí, fico com Gandhi que escreveu que “quando só é possível escolher entre a covardia e a violência, eu aconselharia a escolha pela violência”.
Portanto, a pixação, janelas quebradas, e ônibus queimados são apenas a reação de quem é oprimido pelo Estado e esta reação não pode ser confundida com a violência e repressão do opressor – Estado e setor privado. Afinal, prédios, automóveis e muros nunca são violentados, nem quando atacados; violência é algo que apenas a gente pode sofrer, o que acontece diariamente num país tão desigual como o nosso.
Augusto Salla
Publicitário e baderneiro
Foto: Musa Al-Shaer/AFP