No sábado, dia 01 de agosto, aconteceu mais um evento promovido pelo coletivo Cais Mauá de Todos, que questiona o atual projeto de revitalização da área do cais. Como há alguns dias foi entregue o EIA-RIMA (Estudo do Impacto Ambiental) pelo consórcio responsável pelo projeto, o coletivo trouxe algumas pessoas que avaliaram o estudo e traçaram alguns comentários pertinentes.
Foram levantadas questões sobre os impactos que a área receberia, do ponto de vista urbanístico e ambiental. Professores, estudiosos e profissionais da área trouxeram informações que devem ser conhecidas da população, antes de aceitar o atual projeto como a única possibilidade de reconectar o espaço do cais – e por consequência o próprio Guaíba – à cidade.
Até porque a reconexão não está prevista no projeto. Com o aumento do fluxo de carros para o local, trazidos pela implantação de um shopping à beira do Guaíba e de, pelo menos, duas torres de 100m (algo como 30 andares), os acessos viários que separam o rio da cidade tendem a ser ampliados.
E o que dizer da praça onde ocorreu o evento da audiência pública, a Brigadeiro Sampaio? Será transformada em canteiro de obras para a construção do shopping, pela proximidade, na área do Armazém A7, que será demolido. Além disso, será construída uma passarela ligando a praça ao shopping, que colocará abaixo muitas árvores e influenciará a própria configuração do local. No sábado, foram marcadas com um laço preto as árvores que serão derrubadas.
Ao longo dos meses em que os participantes do coletivo têm proposto atos e ações, algumas pessoas foram agregando-se ao movimento, cedendo seu tempo e energia para que informações sejam obtidas, para que ilegalidades sejam questionadas e para que pessoas possam expressar suas ideias em relação ao projeto que vai modificar a paisagem da cidade de forma indelével. Mas tenho constatado que a Porto Alegre combativa, a mesma que colocou seu nome no mundo como sede do Fórum Mundial Social, está aparentemente anestesiada.
E o que aconteceu com aqueles que, em 2013, iniciaram as manifestações que foram o estopim de outras pelo Brasil afora, pelo preço da passagem de ônibus? Hoje, o valor que deve ser assegurado não é menor: é o da qualidade de vida, do espaço público e do patrimônio histórico e cultural. É uma luta que representa nosso presente e futuro.
Coloco aqui uma pergunta que tenho me feito e que compartilho para chegar a uma resposta: como transformar todo o ativismo das redes em braços, pernas e vozes? Penso e não imagino viva alma contrária à ocupação do Cais Mauá. Acreditem, não existe apenas o abandono (como hoje) ou o “combo” cais-shopping-espigões (como o proposto). Existem alternativas, existem possibilidades, existem exemplos de aproveitamento do espaço que aliam comércio e cultura, preservação e modernidade. Mas precisamos nos manifestar, dizer que queremos participar e que nos interessa, e muito, o que acontece com nossa cidade.
Aguardo sugestões, braços, pernas e vozes para trazer de volta a Porto Alegre das lutas e da construção da cidadania, tão necessária nestes tempos bicudos!
Boa tarde
Por curiosidade gostaria se possível que me desse um pequeno esclarecimento.
Eu sou português trabalho numa perfeitura e neste momento trabalho na área das cidades inteligentes, além de estar a fazer uma dissertação sobre o mesmo temáa onde faço uma abordagem das principais áreas de estudo que : que incluem inovação social, qualidade de vida, patrimônio, Cultura, tecnologia, etc.
Como base de estudo escolhi duas cidades Suecas e Duas espanholas e outras boas práticas de outras cidades. No caso do Brasil tenho estado a seguir Curitiba, Recife e Porto Alegre.
No caso de Porto Alegre o acompanhamento que tenho feito pela internet. …e que agora já tenho algumas dúvidas…é que era uma cidade com uma forte participação e envolvimento da população e que a perfeitura fazia uma boa divulgação pública dos seus actos. Mas por este artigo parece contradizer essa minha opinião.
Eu sei que por exemplo no caso do Recife parte da população se mobilizou no caso do cais da estelita. Mas lá prevem a construçao de 14 edifícios de 40 andares. A população revoltou-se contra a destruição do patrimônio histórico, e a alteração da paisagem da cidade…embora na minha opinião além destes problemas o mais grave é a alteração no ambiente urbano..mas só pelos dados que me chegam.
E aí na sua opinião porque é que a senhora pensa que as pessoas não se mobilizam? Tem de haver uma razão.
Obrigado
Carlos Nascimento
Bom dia, Carlos Nascimento!
A pergunta que me fazes é bem complexa e estou procurando alguma resposta. Mas, primeiro, quero te dizer que Porto Alegre foi realmente uma referência em termos de participação popular. Temos uma lei federal (Estatuto da Cidade), que formaliza a participação popular nas decisões que dizem respeito ao planejamento da cidade. Entretanto, os espaços institucionalizados de participação, como os conselhos, no que tange ao desenvolvimento urbano e ambiental, têm tido apenas o papel de legitimar aquilo que as construtoras e a administração pública quer aprovar. A representação da vontade da população está mais presente nas mobilizações populares, como por exemplo na onda de protestos que aconteceram em 2013.
No entanto, atualmente, algo está acontecendo em relação à participação efetiva das pessoas em atividades presenciais. Não sei se é o fato de que o ativismo nas redes sociais dá a (falsa) ideia de participação efetiva, que acaba dando às pessoas a sensação de não haver necessidade de estarem presentes nos eventos, o que é um grande erro. Outro ponto que tenho observado é que as pessoas têm pouca disponibilidade para o coletivo. O foco no individual tem se intensificado e a pouca informação sobre assuntos cruciais têm afastado uma participação mais efetiva da população nas decisões. E, nesse ponto, a administração pública de Porto Alegre tem faltado muito. Posso dizer isso por experiência própria, já que formalmente pedi informações sobre assuntos relativos ao Cais Mauá (com número de protocolo) e jamais recebi resposta. Sei de outras pessoas que também tiveram essa mesma experiência.
Se quiseres outras informações para te municiar na tua dissertação, meu email é jacquecustodio@gmail.com. Terei o maior prazer em trocar informações e experiência. Abraço!