De uns tempos para cá, venho mudando minha percepção sobre a maternidade e sobre as crianças. E isso, em nada altera meu entendimento de que a maternidade não deve ser uma imposição às mulheres. Que ter ou não ter filhos é uma escolha. Que a autonomia sobre o próprio corpo e sobre a sexualidade, ainda está na condição de direitos a serem realizados para todas elas.
Hoje, meu olhar sobre a maternidade está relacionado à experiência do que isso significa, o que reforça, ainda mais, a necessidade de que seja uma escolha. Talvez pelo fato de que a maternagem esteja mais perto: grandes amigas se tornaram mães. Talvez porque elas tenham se transformado em mulheres ainda mais inspiradoras; talvez porque, de certa forma, elas nos transformam com isso. Sei lá! O fato é que hoje a maternidade me cativa; e as suas filhas, reanimam minha noção de humanidade.
Minha sensibilização à maternidade, minha aproximação e o contato com estas mulheres maravilhosas, que embarcaram nesta grande viagem sem volta, me levaram a ler e conhecer mais sobre os direitos das grávidas. E com isso, os direitos que são negados às mulheres, também por ocasião da gestação, e especialmente por ocasião do parto.
Em algum momento destas andanças, me chegou à mão: Renascimento do Parto – O Filme. Desde então, não consigo mais pensar a maternidade e os filhos, sem sentir alguma necessidade de nascer de novo. Eu, que sou individualmente, a segunda de quatro filhos nascidos de parto normal. Eu, que socialmente considerada, sou filha de um tempo em que nascer foi equiparado a patologia tratável em hospital.
No filme somos convidados a repensar a forma que nascemos para repensar o mundo em que vivemos. O mundo que temos e o que queremos. Isto porque, a patologização de um processo fisiológico como o parto, denota em alguma medida, o adoecimento das nossas afetividades e da nossa sociedade. Neste quadro, a hora para nascer não é aquela biológica, determinada pela formação do bebê e pelo corpo da mãe; a hora de nascer é aquela que a agenda do hospital permite e que o médico disponibiliza.
Hoje, no Brasil a regra para vir ao mundo é o parto cesariano, que corresponde a 84% dos procedimentos realizados na rede privada de saúde. Na rede pública os índices alcançam 40%, enquanto a Organização Mundial de Saúde recomenda que não se exceda o limite de 15%. Ao passo disso, temos os efeitos na saúde da população, por decorrência de procedimentos obstétricos sem necessidade clínica, entre os quais: mortalidade materna; doenças respiratórias; aumento das internações em UTI’s e neonatal, entre outras.
Neste quadro, já se fala em uma epidemia das cesarianas, em que o parto normal: “o não indicado”, “o doloroso”, “o mais difícil”, “para quem é corajosa”, torna-se a exceção. E por isso, merece a nossa atenção e a atuação das diversas organizações de saúde, pois precisamos devolver a humanidade ao nascimento. Precisamos das mulheres e seus filhos protagonizando o parto. Precisamos que des-hospitalizar a vida. Precisamos todos, experimentar os hormônios do amor!
Importante registrar que algumas iniciativas importantes já são percebidas, no tema da humanização do parto; na preservação dos laços e afetos ao nascer; do reconhecimento da violência obstétrica; do enfrentamento aos índices alarmantes de cesarianas. Mas temos muito a fazer, para que esta grande aventura de vir ao mundo seja plena, digna e segura.