Antes de mais nada, gostaria de dizer que sou completamente a favor de que o Cais Mauá seja reabilitado e entregue à população de Porto Alegre. É um espaço simbólico da cidade e representa um patrimônio histórico e cultural inestimável. Mas é mais que isso: é um patrimônio afetivo de todos os porto-alegrenses.
Tem-se que o atual plano de negócios do consórcio de empresas que atualmente administra a área do cais prevê a restauração dos armazéns e de outros imóveis que lá se localizam. Para isso, já houve consulta prévia aos órgãos responsáveis pelas questões de preservação, que emitiram laudos e pareceres. E todos eles têm em comum o fato de que qualquer intervenção naqueles bens tombados deve seguir orientações e limitações impostas, a fim de não descaracterizá-los.
Todos sabemos que as obras do cais estão paradas e vários são os motivos, que não nos interessam nesse momento, dentro do contexto que escrevo. Mas o fato é que dos 11 guindastes que existiam no porto, apenas 4 resistem. Os outros foram vendidos como sucata. Ocorre que TODOS eram protegidos, conforme as diretrizes da Equipe de Patrimônio Histórico e Cultural do Município de Porto Alegre e do COMPAHC, que integram o Parecer nº 061/09 da Comissão de Análise Urbanística e Gerenciamento – CAUGE:
Nos espaços externos, não edificados, poderão ser previstos equipamentos de mobiliário urbano, sempre em caráter reversível; a pavimentação em paralelepípedo deverá ser preservada, regularizada, mas serão permitidos passeios intercalados que garantam a acessibilidade universal. Os guindastes deverão ser preservados e valorizados, bem como os trilhos, que poderão ser aproveitados para o transporte coletivo local; as redes elétricas e de telefonia deverão ser subterrâneas.
Agora, um novo crime contra o patrimônio está ocorrendo. As portas do armazém A2 foram retiradas. E nada se sabe ou se comenta sobre isso: apenas sumiram. Estamos falando de bens tombados e, por isso, protegidos. As estruturas de tais prédios compõem-se de peças metálicas rebitadas em ferro, importadas da empresa Daydée, de Paris, e montadas no local. As portas são elementos constitutivos e essenciais para a manutenção de suas características. Onde estão? Vendidas também como sucata? Quem responde por essa perda?
O próximo capítulo do desmonte já está anunciado: a demolição do Armazém A7. Ele não tem as características dos outros, foi construído anos depois, mas faz parte do perfil do conjunto, que é identificado como a silhueta de Porto Alegre, que associada à Usina do Gasômetro, produz nosso mais conhecido cartão postal.
Nossa cidade já perdeu e vem perdendo muito de seus bens culturais, através das sucessivas demolições ou do descaso com edificações que contavam períodos de nossa história. Agora, pouco a pouco, vamos perdendo parte fundamental de nossa identidade.
Os guindastes se foram e isso foi aceito sem discussão. As portas dos armazéns estão sendo retiradas. O Armazém A7 está condenado. Tudo incluído no pacote de “revitalização” do Cais Mauá. Vamos nos resignar com isso? Já existe uma mobilização da sociedade pedindo por transparência, legalidade e participação popular na proposta desse projeto. Informe-se, participe, divulgue. Já barramos a destruição do Mercado Público, da Usina do Gasômetro e do Parcão. Agora é a vez do Cais Mauá.
Peço desculpa, mas seu texto possui informações incorretas em relação aos guindastes. Os guindastes tombados foram retirados e substituídos pela SPH há muitos anos. Os que estavam no Cais quando a empresa ganhou a licitação já não são os originais e não eram tombados.
Outra questão importante, é o fato de que as portas não serão necessariamente descartadas. Caso sejam, elas devem ser substituídas por portas novas. O que não é dito em seu texto, é o estado de conservação das mesmas. Infelizmente o Cais não foi preservado e suas estruturas metálicas estão totalmente corroídas pelo tempo e uso. Especialmente as do armazém A2. Querendo ou não, essas estruturas são uma ameaça às pessoas, já que contêm substâncias químicas, ferrugem e estão quebradas, formando pontas afiadas.
Gostaria de acrescentar que, segundo o projeto de revitalização divulgado, pode-se ver que as características do “cartão postal” de Porto Alegre continuarão em pé.
É uma satisfação poder finalmente acreditar que um local tão importante para Porto Alegre e seus cidadão, vai ser totalmente reformado, aberto e com muitas atrações para os porto-alegrenses e turistas. Acredito que essas obras virão para o bem da cidade e fico imensamente triste em ver que pessoas, conhecedoras da história da cidade, não conseguem ver isso.
Oi, Julia. Primeiro gostaria de te agradecer a informação que estás me passando. Inclusive, se fosse possível, gostaria muito de saber a fonte de tal informação, justamente para não postar nada equivocado.
A proteção dos guindastes foi uma das diretrizes do parecer citado no texto, na página 7, sobre as áreas não edificáveis. Esse parecer é resultado do processo nº 002.316484.00.5, no qual o Governo do Estado do RS solicitava reconsideração das Diretrizes Urbanísticas para o Projeto Cais Mauá. A data do documento é de 13/05/2009, um ano antes da assinatura do contrato de concessão de uso.
Então fica a dúvida: os guindastes originais foram tirados muitos anos antes, seria quando?
Quanto às portas, eu não disse que serão descartadas, mas poderiam ser, já que não temos informação de onde estão. Por isso a pergunta: onde estão as portas? Se elas não estão em condições, devem passar por uma equipe especializada de restauro, posto fazerem parte de um bem tombado, para que sejam determinados os procedimentos cabíveis. E o quanto eu sei, ninguém, nem mesmo os trabalhadores do porto, têm acesso à área, diminuindo o risco.
Por fim, o projeto de revitalização não foi exatamente divulgado. O que sabemos é uma simulação daquilo que um dia foi pretendido para o local. Acredito que três edifícios com até 100 m de altura alterem, sim, o skyline da cidade. Aliás, a falta de informação sobre o anteprojeto é uma das irregularidades constatadas pelo TCE, em seu relatório. Eu mesma já solicitei informações variadas sobre o assunto e nunca recebi retorno, mesmo com a vigência da lei de informações.
Volto ao início de meu texto: não sou contra a reabilitação do Cais Mauá. Apenas tenho a firme convicção que o patrimônio de Porto Alegre, e o cais certamente é um dos maiores, tem que ser preservado. A cidade tem um perfil característico, que faz parte de sua identidade, e qualquer dano a ele tem que ser combatido. E te digo que não estou sozinha quanto às dúvidas sobre a possibilidade de danos a esse patrimônio. O Ministério Público Estadual tem um inquérito civil justamente averiguando possíveis danos ao patrimônio tombado, desde 2009.
Aguardo mais informações sobre os guindastes Se puderes me fornecer, ficaria imensamente grata.
Abraço!
Olá Jacqueline
Sua preocupação com o patrimônio histórico da nossa cidade é muito louvável, e meu escritório também abraça a causa da valorização da nossa história, do nosso patrimônio. Eu trabalho junto a equipe do projeto do Cais, e infelizmente está ocorrendo uma falta de entendimento de algumas questões pela comunicação falha entre o consórcio que está trabalhando duro para fazer a obra acontecer e a prefeitura com a sociedade. Cheguei a comentar esta tua mesma postagem no face, mas pode ter se perdido em meio a outras tantas. Quanto aos guindastes, eles eram de propriedade da Superintendencia de Portos e Hidrovias, e pelo contrato de concessão do Governo do Estado com o consórcio, apenas 4 ficariam como partes integrantes do projeto (que serão restaurados). O restante foi vendido como sucara pela SPH. O que vejo neste caso foi uma desarticulação entre a SPH e a prefeitura, que permitiu que ocorresse este desmanche. Quanto aos portões do armazém A2, estes não existem fazem anos. Este armazém especificamente é o mais deteriorado pelo seu uso como depósito de fertilizantes, a estrutura interna está praticamente toda corroída pela ferrugem e será totalmente restaurada. Quanto ao A7, trata-se de um armazém executado muito posteriormente aos outros, feito em estrutura de concreto, ao contrário dos originais em metal, considero uma cópia dos originais. O mesmo também não apresenta nenhum impeditivo legal para a sua demolição. O projeto é muito sensível as questões históricas, uma equipe extremamente qualificada trabalhou nos projetos. O que falta do meu ponto de vista é um canal claro das informações do projeto para a população.
Abs,
Rodrigo Poltosi
Oi, Rodrigo!
Que boa a tua manifestação. Aliás, a primeira vindo de alguém que tem alguma ligação com a proposta de revitalização do cais. Como disse no início de meu texto, tudo o que quero é ter de volta o Cais Mauá para a sua população. E quando digo para a população é de forma ampla, mesmo que seja para ali tomar um chimarrão vendo o por-do-sol. Concordo totalmente contigo quanto à falta de comunicação entre os lados e isso é um aspecto muito importante, principalmente quando se trata de uma obra realizada num local que é mais do que patrimônio histórico, é um patrimônio afetivo da cidade. Deveria ser uma construção conjunta, embora eu saiba o quanto isso é complicado.
Quanto às tuas observações: os guindastes poderiam ser da SPH, mas se havia diretriz apontado para a proteção, e o EIA-RIMA também traz essa indicação, algo está errado no contrato e, portanto, questionável a indicação de retirada para ser vendido como sucata. E mais, o edital de licitação é bem claro sobre as diretrizes do Parecer (p.60 do edital): “As diretrizes para a apresentação das propostas foram definidas pela CAUGE, constante no Parecer nº 061/09 que reavaliou as diretrizes emitidas pelo parecer nº 101/06. Portanto, para evitar desnecessária tautologia, as propostas deverão lastrear-se nos princípios e diretrizes urbanísticas constantes nos pareceres ora referidos, que fazem parte integrante dos anexos do Edital de Licitação”.
Quanto às portas do A2, recebi hoje fotos de 2013, constatando sua falta. Volto a dizer, se os armazéns são tombados, e o foram em 1996 pelo município, o ente público tem o dever de preservá-los. É dele a responsabilidade pelo desaparecimento das portas, caso isso tenha ocorrido antes de 2010. Se após, é responsabilidade do consórcio que ganhou a licitação.
Quanto ao A7, sei que é mais novo e não tem as características pelas quais os outros armazéns foram tombados (já ouvi de um arquiteto amigo que ele é uma imitação barata dos outros). Também sei que os órgãos que trabalham com a questão de patrimônio já se pronunciaram sem restrição quanto à demolição. Mas não se trata da preservação da unidade autônoma A7 e, sim, do conjunto arquitetônico dos armazéns, que dá a identidade ao perfil da cidade. Assim, da mesma forma que foi preservada a caixa d’água de Petrópolis, que não tem características arquitetônicas relevantes, a preservação do A7 se dá dentro do contexto de conjunto e patrimônio afetivo da população. A demolição dele para dar lugar a um shopping center ainda torna mais difícil a aceitação.
Embora, como tu dizes, o projeto seja sensível à preservação dos bens, até porque são tombados, a construção de edifícios na orla e do referido shopping irão alterar o perfil de Porto Alegre. E é contra isso que tem gente que se insurge. Tenho certeza de que todos querem o Cais Mauá de volta, mas percebo que muita gente não quer pagar um preço tão alto, quanto a modificação de um de seus mais caros cartões postais.
Sinceramente, Rodrigo, gostaria muito de continuar o diálogo contigo. Pensa na possibilidade. Obrigada, novamente, pela tua intervenção.
Abraço
Jacqueline
Olá Jacqueline,
Este não é um canal adequado, do meu ponto de vista, para conversar sobre um projeto tão complexo numa área tão querida da nossa cidade. Toda discussão feita em facebook, blog, jornal, IAB, manifestações, tratam muito, mas muito superficialmente o tema e muitas vezes de forma até maldosa ou com segundas intenções (talvez entenda isto pela total falta de desinformação das pessoas, pela multiplicação de opiniões rasas sobre o assunto, ou porque sempre tem alguém querendo aparecer num processo grande como esse).
Eu conheço muito bem todo o processo, os problemas enfrentados, burocracias…estou nessa deste 2009. Eu sempre me mantive aberto a qualquer um a falar sobre o projeto (inclusive o apresentei algumas vezes em pequenas aulas em faculdades de arquitetura), mas não posso responder oficialmente pelo Cais ou pela Prefeitura, apenas posso expor meu ponto de vista e esclarecer alguns pontos que acabam tornando uma dimensão absurda pela total falta de informação.
Abs,
Rodrigo Poltosi
Concordo, Rodrigo! Aqui não é o lugar adequado. Poderíamos marcar um encontro, para que tu pudesse mostrar os projetos, explicar, enfim, iniciar uma canal de comunicação. Seria uma forma de esclarecer e dar informações. Talvez um pequeno grupo mais interessado.
Abraço
Jacqueline