Já que prometi, hoje vou escrever sobre o jornalista norte-americano Hunter S Thompson, o fundador e único praticante do jornalismo gonzo. Como há muita coisa para ser dita, chega de papo furado e vamos ao que interessa.
Hunter Thompson nasceu em 1937 na cidade de Louisville, no estado do Colorado, e se matou em 2005 com um tiro na cabeça. Dizem que, depois de sobreviver ao governo Nixon, o governo Bush foi demais para ele. Resumindo, desde a infância Hunter foi o que os velhinhos conservadores chamariam de pequeno delinqüente: se envolvia em brigas, travessuras, pequenos furtos, falsificação de documento pra comprar bebida alcoólica quando era menor de idade, etc. Não se formou no colégio porque estava preso na noite de formatura. Para sair da prisão, foi proposto que ingressasse no exército americano. Optou pelas Forças Aéreas, onde passou a integrar a equipe que fazia o jornal da corporação, atuando como editor de esportes. Durante a vida, quebrou todos os tipos de normas: sociais, legais e jornalísticas. Primeiro andou um ano com a gangue de motociclistas Hell’s Angels. Dessa experiência escreveu seu primeiro livro, que leva o nome do grupo de motoqueiros como título. Depois, quando foi cobrir o Kentucky Derby, uma corrida de cavalos de Louisville, ao invés de abordar em seu texto a corrida, apresentou um texto caricatural do público, em uma narrativa autobiográfica onde descrevia todos os seus pequenos crimes (como sair de hotel sem pagar) e uso de bebidas e drogas (e seus respectivos efeitos). Foi casado duas vezes. Do primeiro casamento, teve o filho, Juan Thompson.

O auge do jornalismo gonzo foi a cobertura que fez de uma corrida de motocicletas para uma revista esportiva norte-americana, Sports Illustrated, que aconteceria em Las Vegas. Só que a revista pediu 250 palavras e ele escreveu 2.500, em primeira pessoa. Ele abre o texto dizendo que gastou todo o pagamento antecipado que recebeu, 300 dólares, em drogas de todos os tipos, que lotaram o porta-malas do carro alugado para fazer a viagem de Los Angeles a Las Vegas. O texto foi rejeitado pela tal revista, mas foi aceito pela Rolling Stone, que não só gostou dessa cobertura, como o manteve em Las Vegas para cobrir uma conferência de combate ao narcotráfico. Ironicamente, toda a cobertura que Hunter Thompson fez do evento foi sob o efeito de narcóticos. Dessas duas coberturas nasceu a obra-prima do jornalismo gonzo: Medo e Delírio em Las Vegas – uma viagem ao coração do sonho americano. Isso foi em 1971. Depois, a Rolling Stone o enviou para Washington, onde cobriu, de maneira completamente diferenciada, a reeleição de Richard Nixon à presidência dos Estados Unidos em 1972. Lá ficou até o caso Watergate. Após esses fatos, seguiu levando a sua louca vida de sempre, até o seu suicídio, em 2005. Morreu aos 67 anos, 17 a mais do que queria ou precisava, conforme escreveu em seu bilhete suicida.
Tentar explicar os textos de Hunter Thompson é praticamente absurdo, pois eles falam por si só. Entretanto, sistematizar e analisar é outra coisa. E é isso que estou fazendo na minha tese de doutorado. A única coisa que posso dizer é que é um material riquíssimo onde uma imagem inicial de um escritor drogado, que não conhece barreiras, que não respeita ninguém, passa a ser substituída por uma imagem de jornalista Robin Woodiano que tenta quebrar as normas para fazer justiça e expor as injustiças do mundo e das leis institucionalizadas. Dessa forma ele cumpre, com um texto maluco, que rompe com as barreiras entre verossimilhança e realidade, uma das principais funções do jornalismo: denunciar tudo que há de podre nas esferas de poder da humanidade.
Não pretendo aqui, nem em nenhum outro lugar, imitar Hunter Thompson. A obra dele é única. Mas pretendo, sim, desenvolver meu próprio estilo, afinal, além dele, já li dezenas de autores tão bons quanto. Enfim, qualquer fã de Hunter Thompson que poderia pensar em imitá-lo desistiria ao ler o seguinte trecho de uma carta que ele enviou a um de seus imitadores, após este mandar uma matéria “gonzo” para ser analisada pela Rolling Stones:
“Seu inútil, sugador de ácido, escritor de peça analfabeta de merda! Nunca mais envie esse tipo de merda de cérebro danificado para cá novamente. Se eu tivesse tempo, eu sairia daqui e cravaria uma estaca de madeira na porra da sua testa. Por que você não arranja um emprego, germe? Talvez entregando folhetos de publicidade de porta em porta, ou vendendo bilhetes para o museu de cera. Vocês do South Bend são todos iguais; como aqueles drogados doidos do escritório da Rolling Stone. Eu gostaria de matar todos os bastardos que me mandam peças… e eu queria matar você também. Enfie essas mórbidas asneiras no seu cu onde o seu público permitirá uma melhor apreciação.
Sinceramente,
Yail Bloor III, ministro das belas letras
OBS. Tenha um bom trabalho. Tenha um bom dia”.
Já estourei o espaço, portanto, tenham vocês todos também, um bom dia. Hasta!