Expertise em administração e coaching são termos da moda. Liderança é uma das chaves para o sucesso. Assunto do momento. Mas contraditório com as atitudes do momento – e de momentos passados – vamos pensar na política. Todo mundo gosta de criticar, pela esquerda, pela direita. Poucos estão dispostos a assumir a liderança. E, com o perdão aos bons políticos, quando cidadãos encaram o desafio de representar sua comunidade no Parlamento ou no Poder Executivo, muitas vezes é com interesses escusos, com o objetivo de ganhar algo com isso.
Como se já não ganhássemos com o incrível fato de ser o representante de um grupo (pequeno ou significativo) de pessoas nas decisões coletivas. O problema é a falta de entendimento sobre o papel da representação política, a falta de cuidado com a coisa pública. Quanto mais se acompanha o nervoso noticiário de política nesses primeiros meses de 2015, mais se chega à repetição do antigo bordão de que no Brasil, público é o que não é de ninguém, e que por isso pode ser roubado, capturado, destroçado.
Operação Lava-jato é exemplo, como foi o Mensalão, como foi o Mensalinho Mineiro, como também a sonegação fiscal (que se trata sim de crime, por não passar ao Estado – e por tanto a todos os cidadãos brasileiros – a parte que compete a cada pessoa ou empresa). Assim como é corrupção favorecer amigos em contratos com empresas públicas e, ao extremo que parece inofensivo: bater o ponto pelo colega que não está trabalhando, e fazer uso particular de recursos públicos (sim, aquela cópia particular que você fez na empresa pública quando ninguém mais estava na sala).
Se o líder de turma no ensino fundamental eventualmente quer favorecer um amigo em função de sua posição, como podemos esperar que, nas grandes instâncias de poder haveria honestidade? É claro que com isso não estou justificando todos os escândalos de corrupção recentes, mas precisamos observar a questão da corrupção generalizada como uma herança cultural que precisa ser combatida. Se não for, podemos derrubar presidente atrás de presidente e a coisa seguirá se repetindo e nossos cofres sendo saqueados. E o que é pior, por nós mesmos! Ou você faria diferente? Ou ainda melhor: você toparia o desafio de representar sua comunidade? E teria a ousadia de fazer diferente? Ou jogaria a desculpa na governabilidade: “é impossível governar se eu não entrar no jogo”.
Esse jogo, diga-se, é quase sempre o mesmo. É o jogo das empresas privadas. Das grandes empresas. É o jogo do capitalismo. A jornalista Suely Caldas, que por muito tempo trabalhou na cobertura de jornalismo econômico, lembra de maneira bem simples parte da história confusa que associa política, economia e corrupção em nosso país. O trecho é longo mas vale a leitura (e não é mera coincidência sua semelhança com o momento presente).
“Em 1992, quando o ex-presidente Collor vivia a ameaça de impeachment e as empreiteiras eram acusadas de corromper o governo, entrevistei o dirigente de uma dessas empresas, que tentava justificar a relação promíscua entre poder público e interesses privados. Contava ele que, na época dos militares, para conseguirem obras oficiais, as empresas pagavam comissão apenas para um representante do governo federal, já que não havia eleições, sendo governadores e prefeitos de grandes capitais nomeados e controlados pelos generais. Com a distensão política, no final dos anos 70, governadores e prefeitos passaram a ser eleitos pelo voto popular e, por sua vez, as empreiteiras começaram a ser assediadas por candidatos — do governo e da oposição — para doarem dinheiro para campanhas em troca de obras quando estes fossem eleitos. As empreiteiras passaram a distribuir dinheiro para os políticos e as obras, evidentemente, ficaram mais caras. Nos anos 80, continuava o relato, os candidatos a governador duplicaram o preço, alegando precisar eleger também suas bancadas de deputados e senadores em Brasília, que tratariam de arrancar emendas ao orçamento federal para pagar as obras. Se o custo da obra mais a margem de lucro era 100, passou a ser 200. E quem pagava a conta? A população, é claro, que sustenta os governos pagando impostos.”
O relato consta no livro Jornalismo Econômico (Editora Contexto, 2003). Suely ainda conclui: “Esse exemplo sintetiza como tem agido a classe política nos últimos 25 anos. E também nos ajuda a entender as razões do descalabro fiscal a que esteve exposta a população brasileira, obrigada a custear, com pagamento de impostos, excesso de gastos, desequilíbrio nas contas e endividamento acelerado dos governos federal, estaduais e de grandes municípios”.
O problema não é a Dilma. O problema não foi FHC. O problema é como tem agido a “classe política” majoritária nos últimos anos. Com o investimento que as empresas fazem em campanhas de boa parte dos políticos, muitos criminosos de colarinho branco fazem política sem jamais olhar para o povo. Governam pensando em suas contas bancárias.
Se isso serve para o discurso senso comum de que “político é tudo igual”, e para um voto sem muita reflexão nas próximas eleições, minha provocação é: então como vamos construir uma sociedade melhor? Para um futuro melhor e uma vida mais justa em sociedade, alegar desinteresse na política não serve. Pelo contrário, devemos nos apropriar dela e tomar espaço, a começar pela Reforma Política e barrar o financiamento privado feito por empresas.